Consultar especialistas pode atrasar o diagnóstico

Jerome Groopman e Pamela Hartzband, médicos do Boston’s Beth Israel Deaconess Medical Center, relataram (em inglês) um caso em que a paciente procurou atendimento médico logo no início dos sintomas, mas só depois de um ano é que o diagnóstico foi fechado. A cada vez em que ela passava mal, procurava o pronto-socorro, e era encaminhada para um especialista diferente. Sua doença só foi descoberta quando ela foi atendida por um clínico geral.

Homens cegos palpando um elefante

© Pawyi Lee (domínio público)

Quando ouvimos sobre o caso, lembramos da parábola dos homens cegos e o elefante. Há versões dessa lenda em muitas culturas, cada uma ligeiramente diferente, mas a mais famosa é a versão Hindi popularizada por John Godfrey Saxe em seu poema. Um grupo de homens cegos toca um elefante para determinar como ele se parece. Cada um toca apenas uma parte do elefante, e eles não chegam a um acordo. No caso dessa jovem, cada especialista viu os sintomas da paciente no contexto de sua própria especialidade.

Medicina de Família e Comunidade e Clínica Médica não são a mesma coisa, mas bons profissionais de ambas especialidades compartilham uma característica: a visão abrangente de seus pacientes. Também é o caso da Pediatria e da Geriatria. (Ainda pretendo explicar a diferença entre um clínico geral e um médico de família. Até lá, sugiro a leitura do artigo Estratégia de Saúde da Família, publicado no Kanzler Melo Psicologia, em que explico não apenas a Saúde da Família mas também o papel de seus profissionais, inclusive do médico de família.)

Essas especialidades, infelizmente, são muito menos prestigiadas que as outras, que se restringem a uma única parte do corpo humano. As consequências são maiores gastos com assistência à saúde, menor satisfação dos pacientes, e piores níveis de saúde.

Até quando?

3 pensou em “Consultar especialistas pode atrasar o diagnóstico

  1. Lenor Costa

    A luta pela medicina preventiva vem desde 1945 com os modelos de Centros de Saúde. Infelizmente, hoje em dia, o povo ainda acha que hospitais com equipamentos modernos e centros de especialidades são as únicas e mais eficazes soluções para a nossa situação precária de saúde. Quando vejo reportagens em minha cidade (Fortaleza-Ceara) falando da superlotação de hospitais de grande porte ou outros de especialidades, pergunto-me se a falta de informação a parcelas da população é algo inerente a ela ou se falta disponibilidade do profissional da ponta de chamar para si a responsabilidade de construir junto uma mudança de comportamento. Ainda não consegui chegar a uma resposta. E, infelizmente, hoje, não atuo na ponta, pois concordo plenamente Medicina de Família e Comunidade e Clínica Médica, com a visão abrangente de seus pacientes, pode fazer bem mais para nossa situação de saúde.

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    1. Leonardo Fontenelle Autor do post

      Cara Lenor, desculpe-me por não ter visto seu comentário mais cedo. A valorização cultural do especialista e da tecnologia dura é recorrente, ao menos nos países chamados ocidentais. A medicina preventiva, a medicina integral, e por fim a saúde comunitária ainda são contra-hegemônicos, mesmo com todo o investimento federal na estratégia Saúde da Família.

      Minha esperança é a profissionalização da gestão pública da saúde nos municípios, aliada a um aumento das despesas federais com saúde. Acredito que tanto um quanto outro fortaleceriam a atenção primária no contexto do SUS.

      Os planos de saúde em geral não valorizam a APS porque não precisam de eficiência. Para diminuir os custos basta comprometer o atendimento, através de co-pagamento, carência, seleção de clientela, e restrição da rede conveniada. A APS só terá espaço entre os planos de saúde quando o nível de exigência do poder público e dos consumidores aumentar.

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  2. Pingback: Clínico geral não é médico de família | Doutor Leonardo

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