{"id":1586,"date":"2010-10-21T00:00:16","date_gmt":"2010-10-21T02:00:16","guid":{"rendered":"http:\/\/leonardof.med.br\/?p=1586"},"modified":"2010-10-27T20:22:18","modified_gmt":"2010-10-27T22:22:18","slug":"um-retrato-do-aborto-no-brasil","status":"publish","type":"post","link":"https:\/\/leonardof.med.br\/2010\/10\/21\/um-retrato-do-aborto-no-brasil\/","title":{"rendered":"Uma retrato do aborto no Brasil"},"content":{"rendered":"

Esse ano foi realizada a primeira Pesquisa Nacional de Aborto<\/cite>, abrangendo 2002 mulheres de todo o territ\u00f3rio nacional. A pesquisa consistiu num inqu\u00e9rito domiciliar, semelhante aos realizados pelo IBGE<\/abbr>, mas usando uma t\u00e9cnica com urna para garantir a sinceridade da entrevistada. Os primeiros resultados<\/a> foram publicados em junho na revista cient\u00edfica Ci\u00eancia & Sa\u00fade Coletiva<\/cite>.<\/p>\n

\"Feto<\/a>

\u00a9 Suparna Sinha (CC-BY-SA-2.0<\/a>)<\/p><\/div>\n

A informa\u00e7\u00e3o que mais chama a aten\u00e7\u00e3o \u00e9 que, ao completarem 40 anos de idade, mais de um quinto das mulheres brasileiras j\u00e1 induziram pelo menos um aborto. A propor\u00e7\u00e3o foi maior entre mulheres com menor escolaridade, mas n\u00e3o houve muita diferen\u00e7a entre religi\u00f5es.<\/p>\n

<\/p>\n

Uma das preocupa\u00e7\u00f5es da pesquisa foi simplificar as perguntas, para n\u00e3o confundir as mulheres com menor escolaridade. Dessa forma, os resultados n\u00e3o incluem o n\u00famero de abortos induzidos por cada mulher. Al\u00e9m disso, as mulheres analfabetas n\u00e3o foram entrevistadas, por n\u00e3o poderem responder sozinhas \u00e0s perguntas do papel que deveriam depositar na urna.<\/p>\n

Das 2002 mulheres entrevistadas, 296 admitiram j\u00e1 ter abortado pelo menos uma gravidez, ou seja, 14,8%. Esse n\u00famero \u00e9 uma m\u00e9dia para todas as entrevistadas, que tinham entre 18 e 39 anos de idade. Apenas 5,7% das mulheres com 18 a 19 anos de idade j\u00e1 abortaram uma gravidez, mas na faixa et\u00e1ria dos 35 aos 39 anos essa propor\u00e7\u00e3o chega aos 22,2%.<\/p>\n

As mulheres com at\u00e9 4 anos de estudo foram as que mais admitiram ter abortado: 23,0%. Essa propor\u00e7\u00e3o vai caindo com o aumento da escolaridade: 18,6% para as com 5 a 8 anos de estudo, e 11,8% para as com ensino m\u00e9dio. Depois a estat\u00edstica volta a subir: 14,0% das mulheres com n\u00edvel superior completo ou incompleto j\u00e1 induziram pelo menos um aborto. A maior parte das entrevistadas tinha n\u00edvel m\u00e9dio, de forma que essa \u00e9 a escolaridade de 38,8% das mulheres que j\u00e1 realizaram pelo menos um aborto.<\/p>\n

Essa varia\u00e7\u00e3o n\u00e3o chega a ser t\u00e3o grande com rela\u00e7\u00e3o \u00e0 religi\u00e3o da entrevistada. 15,0% das mulheres cat\u00f3licas e 13,1% das mulheres protestantes ou evang\u00e9licas j\u00e1 abortaram uma ou mais gravidezes. Essa propor\u00e7\u00e3o \u00e9 de 17,8% entre as sem religi\u00e3o (ou que n\u00e3o informaram sua religi\u00e3o), e 16,0% para as com outras religi\u00f5es. Como o catolicismo continua sendo a religi\u00e3o mais professada no Brasil, 59,1% das mulheres que j\u00e1 induziram um ou mais abortos s\u00e3o cat\u00f3licas.<\/p>\n

A pesquisa tamb\u00e9m coletou dados sobre o \u00faltimo aborto realizado pelas mulheres. O m\u00e9todo utilizado incluiu algum medicamento em 47,6% dos casos, e a interna\u00e7\u00e3o foi necess\u00e1ria em 55,4% dos abortos (contando tanto os com medicamento quanto os com outros m\u00e9todos). Dentre as mulheres que informaram quando foi seu \u00faltimo aborto, 19,8% disseram que foi entre os 12 e os 17 anos de idade, e 60,1% disseram que foi entre os 18 e os 29 anos. (A idade m\u00e9dia da primeira rela\u00e7\u00e3o sexual no Brasil \u00e9 de 13 anos.) 14,5% das mulheres que realizaram pelo menos um aborto n\u00e3o disseram com que idade ele foi induzido.<\/p>\n

Essas s\u00e3o estat\u00edsticas descritivas, e por isso n\u00e3o nos permitem saber, por exemplo, se o ensino superior realmente est\u00e1 associado com as chances de uma mulher ter realizado um aborto (ou vice-versa). Mulheres com ensino superior provavelmente t\u00eam idade superior \u00e0 das que contam apenas com o ensino m\u00e9dio, e a propor\u00e7\u00e3o de mulheres que j\u00e1 interrompeu uma gravidez aumenta com a idade. Imagino que em breve teremos estat\u00edsticas analisando ao mesmo tempo a participa\u00e7\u00e3o da idade, da escolaridade e da religi\u00e3o nas chances da mulher ter induzido um ou mais abortos. Al\u00e9m disso, seria muito bom saber se o m\u00e9todo empregado ou as chances da mulher precisar de uma interna\u00e7\u00e3o dependem de caracter\u00edsticas da mulher, bem como saber se as chances de interna\u00e7\u00e3o est\u00e3o associadas ao m\u00e9todo empregado.<\/p>\n

Espero que edi\u00e7\u00f5es futuras da Pesquisa Nacional de Aborto<\/cite> abordem outras quest\u00f5es, como cor da pele ou a classe socioecon\u00f4mica, que parecem estar associadas \u00e0s chances da mulher induzir um aborto, ou morrer ou ser internada em decorr\u00eancia de um aborto. At\u00e9 l\u00e1, recomendo a leitura do relat\u00f3rio Aborto e sa\u00fade p\u00fablica no Brasil: 20 anos<\/a><\/q>, publicado pelo Minist\u00e9rio da Sa\u00fade em 2009. Usando uma linguagem bem acess\u00edvel, o documento resume as pesquisas cient\u00edficas mais importantes sobre o tema no Brasil, at\u00e9 o ano de 2007.<\/p>\n

Esse \u00e9 um assunto bem pol\u00eamico, e por isso pe\u00e7o a todos que leiam os termos de uso<\/a> do Doutor Leonardo<\/cite> antes de fazer coment\u00e1rios.<\/p>\n

Aproveito para anunciar que daqui a alguns dias publicarei, a pedido de uma leitora, um artigo<\/a> sobre a contracep\u00e7\u00e3o de emerg\u00eancia, mais conhecida como p\u00edlula do dia seguinte.<\/p>\n","protected":false},"excerpt":{"rendered":"

Mais de um quinto das mulheres induzem pelo menos um aborto antes de completar 40 anos de idade.<\/p>\n","protected":false},"author":2,"featured_media":0,"comment_status":"open","ping_status":"open","sticky":false,"template":"","format":"standard","meta":{"footnotes":""},"categories":[1],"tags":[56,32,57],"_links":{"self":[{"href":"https:\/\/leonardof.med.br\/wp-json\/wp\/v2\/posts\/1586"}],"collection":[{"href":"https:\/\/leonardof.med.br\/wp-json\/wp\/v2\/posts"}],"about":[{"href":"https:\/\/leonardof.med.br\/wp-json\/wp\/v2\/types\/post"}],"author":[{"embeddable":true,"href":"https:\/\/leonardof.med.br\/wp-json\/wp\/v2\/users\/2"}],"replies":[{"embeddable":true,"href":"https:\/\/leonardof.med.br\/wp-json\/wp\/v2\/comments?post=1586"}],"version-history":[{"count":20,"href":"https:\/\/leonardof.med.br\/wp-json\/wp\/v2\/posts\/1586\/revisions"}],"predecessor-version":[{"id":1681,"href":"https:\/\/leonardof.med.br\/wp-json\/wp\/v2\/posts\/1586\/revisions\/1681"}],"wp:attachment":[{"href":"https:\/\/leonardof.med.br\/wp-json\/wp\/v2\/media?parent=1586"}],"wp:term":[{"taxonomy":"category","embeddable":true,"href":"https:\/\/leonardof.med.br\/wp-json\/wp\/v2\/categories?post=1586"},{"taxonomy":"post_tag","embeddable":true,"href":"https:\/\/leonardof.med.br\/wp-json\/wp\/v2\/tags?post=1586"}],"curies":[{"name":"wp","href":"https:\/\/api.w.org\/{rel}","templated":true}]}}