{"id":2871,"date":"2011-11-21T00:00:45","date_gmt":"2011-11-21T02:00:45","guid":{"rendered":"http:\/\/leonardof.med.br\/?p=2871"},"modified":"2011-11-21T00:35:33","modified_gmt":"2011-11-21T02:35:33","slug":"gravidez-na-adolescencia-e-causada-por-trauma-de-infancia","status":"publish","type":"post","link":"https:\/\/leonardof.med.br\/2011\/11\/21\/gravidez-na-adolescencia-e-causada-por-trauma-de-infancia\/","title":{"rendered":"Gravidez na adolesc\u00eancia \u00e9 causada por trauma de inf\u00e2ncia"},"content":{"rendered":"
De acordo com o IBGE<\/abbr><\/a>, 5,5% das adolescentes com 15 a 17 anos de idade j\u00e1 tiveram um ou mais filhos. N\u00e3o estou aqui para dizer se uma adolescente pode ou deve ter filhos, mas v\u00e1rios estudos mostram que uma gravidez na adolesc\u00eancia pode trazer uma s\u00e9rie de consequ\u00eancias negativas tanto para a m\u00e3e quanto para o filho. \u00c9 impressionante como uma garota pode engravidar sem querer, com tanta facilidade de informa\u00e7\u00e3o e acesso a m\u00e9todos de planejamento familiar (camisinha, p\u00edlula etc.), ou como uma garota possa decidir engravidar e assim prejudicar seu futuro nos estudos e no trabalho. <\/p>\n Quando lidamos com os adolescentes, vemos que a realidade \u00e9 muito mais complexa. Poucas vezes a gravidez pode ser considerada como um acidente completo; muitas vezes o casal sabia que corria o “risco” de engravidar, ou ent\u00e3o a gravidez foi mesmo planejada. O frequente abandono dos estudos pode n\u00e3o parecer importante para a adolescente, e \u00e0s vezes a ordem \u00e9 inversa: primeiro a adolescente abandona os estudos, e depois engravida. O namoro, uni\u00e3o est\u00e1vel ou casamento com uma pessoa j\u00e1 estabelecida profissionalmente pode ser um motivo para a adolescente abandonar os estudos, ou pelo menos n\u00e3o abortar em caso de gravidez acidental<\/a>. Por fim, uma gravidez pode significar para a adolescente um meio de ganhar prest\u00edgio social, ou mesmo de sair de uma fam\u00edlia inadequada.<\/p>\n <\/a><\/p>\n Na d\u00e9cada de 90, o CDC<\/abbr> realizou, em conv\u00eanio com o plano de sa\u00fade Kaiser Permanente<\/span>, um estudo com 17 mil pessoas adultas, examinando a rela\u00e7\u00e3o entre o estado de sa\u00fade atual e uma s\u00e9rie de traumas de inf\u00e2ncia<\/a> (e adolesc\u00eancia), conhecidos tecnicamente como experi\u00eancias adversas na inf\u00e2ncia<\/em>. Os traumas de inf\u00e2ncia estudados incluem maus-tratos f\u00edsicos (bater n\u00e3o educa<\/a>!), emocionais e sexuais, neglig\u00eancia emocional ou f\u00edsica, e o testemunho de problemas familiares como agress\u00e3o f\u00edsica da m\u00e3e, uso de drogas (inclusive \u00e1lcool) por algu\u00e9m da casa, adoecimento mental de algu\u00e9m da casa, div\u00f3rcio ou separa\u00e7\u00e3o dos pais, ou envolvimento de familiares em crimes.<\/p>\n O grupo confirmou que os traumas de inf\u00e2ncia est\u00e3o associados a um comportamento menos saud\u00e1vel e a mais problemas de sa\u00fade. Ano passado eu j\u00e1 tinha listado as principais doen\u00e7as da mulher<\/a> e do homem<\/a> brasileiros, bem como os principais fatores de risco (da mulher<\/a> e do homem<\/a>) que levam essas pessoas a adoecer; o terceiro elo dessa cadeia seriam os traumas de inf\u00e2ncia.<\/p>\n <\/p>\n O artigo mais importante, publicado na revista cient\u00edfica Pediatrics<\/cite><\/a>, encontrou uma rela\u00e7\u00e3o clara entre os traumas de inf\u00e2ncia e a gravidez na adolesc\u00eancia. Cada um dos tipos de trauma aumentou o risco de gravidez entre 20% e 90%, e quanto mais traumas de inf\u00e2ncia, maior o risco de gravidez na adolesc\u00eancia. O mais interessante foi que a gravidez na adolesc\u00eancia realmente se mostrou associada a uma s\u00e9rie de problemas sociais e mentais (problemas familiares s\u00e9rios, problemas financeiros s\u00e9rios, estresse elevado e medo de n\u00e3o conseguir controlar a raiva), mas apenas para as mulheres que passaram por um ou mais traumas de inf\u00e2ncia. No caso das mulheres sem traumas de inf\u00e2ncia, a gravidez na adolesc\u00eancia n\u00e3o se associou a problemas atuais.<\/p>\n Dois outros artigos, publicados na Pediatrics<\/cite><\/a> e na Obstetrics and Gynecology<\/cite><\/a>, descobriram que o mesmo racioc\u00ednio se aplica a homens e adolescentes do sexo masculino que engravidam uma adolescente.<\/p>\n Mas nem tudo na vida s\u00e3o espinhos: outro artigo, publicado no The Permanente Journal<\/cite><\/a>, tamb\u00e9m encontrou caracter\u00edsticas familiares capazes de proteger as adolescentes contra a gravidez. As caracter\u00edsticas positivas estudadas foram a proximidade entre os familiares; o suporte que ent\u00e3o crian\u00e7a recebia da fam\u00edlia; a lealdade entre as pessoas da fam\u00edlia; a prote\u00e7\u00e3o recebida; a import\u00e2ncia que a pessoa tinha dentro da fam\u00edlia; o amor recebido; e a prontid\u00e3o da fam\u00edlia em cuidar da sa\u00fade da pessoa. Quanto maior o n\u00famero de caracter\u00edsticas positivas, e quanto maior a intensidade dessas caracter\u00edsticas, menor o risco de gravidez na adolesc\u00eancia, ou de problemas psicossociais durante a vida adulta.<\/p>\n O primeiro artigo mostrou ainda que as mulheres que relataram traumas de inf\u00e2ncia tinham maiores chances de serem elas mesmas fruto de uma gravidez na adolesc\u00eancia. \u00c9 poss\u00edvel que a gravidez na adolesc\u00eancia funcione como um elo entre as gera\u00e7\u00f5es, facilitando para que pessoas com traumas de inf\u00e2ncia, e pouca sa\u00fade ou bem-estar, tenham filhos com traumas de inf\u00e2ncia e pouca sa\u00fade ou bem-estar.<\/p>\n Dois ter\u00e7os das mulheres relataram passar por pelo menos um trauma durante sua inf\u00e2ncia ou adolesc\u00eancia. Mesmo dentre as mulheres criadas em fam\u00edlias com muitas caracter\u00edsticas positivas, mais da metade relataram algum trauma de inf\u00e2ncia. Uma crian\u00e7a que \u00e9 levada ao m\u00e9dico sempre que necess\u00e1rio pode, por exemplo, estar presenciando sua m\u00e3e ser agredida pelo namorado.<\/p>\n Quero deixar claro que o trauma de inf\u00e2ncia n\u00e3o \u00e9 a \u00fanica causa<\/strong> de gravidez na adolesc\u00eancia. Mesmo uma adolescente sem traumas de inf\u00e2ncia (e com fam\u00edlias cheias de caracter\u00edsticas positivas) pode engravidar. Os autores calcularam que um ter\u00e7o das gravidezes na adolesc\u00eancia sejam atribu\u00edveis a maus-tratos, neglig\u00eancia e disfun\u00e7\u00e3o familiar, embora admitam que o n\u00famero real pode ser maior, se de fato nem todas as v\u00edtimas tiverem relatado seus traumas de inf\u00e2ncia.<\/p>\n Apesar da pesquisa ter sido realizada nos Estados Unidos, acredito que as conclus\u00f5es se apliquem ao Brasil, e que por aqui o problema seja pelo menos da mesma dimens\u00e3o, se n\u00e3o maior. Interromper esse ciclo vicioso \u00e9 um desafio assombroso, porque significa, em \u00faltima an\u00e1lise, modificar a pr\u00f3pria sociedade que faz adoecer seus indiv\u00edduo.<\/p>\n Nota de agradecimento<\/strong>: Esse artigo s\u00f3 foi poss\u00edvel gra\u00e7as \u00e0 m\u00e9dica de fam\u00edlia brit\u00e2nica Iona Heath<\/span>, que citou o estudo em um recente discurso (em ingl\u00eas)<\/a> para o Royal College of Physicians<\/cite>, do Reino Unido.<\/p>\n","protected":false},"excerpt":{"rendered":" Eventos adversos na inf\u00e2ncia aumentam o risco de gravidez na adolesc\u00eancia.<\/p>\n","protected":false},"author":2,"featured_media":0,"comment_status":"open","ping_status":"open","sticky":false,"template":"","format":"standard","meta":{"footnotes":""},"categories":[1],"tags":[108,107,56,57,72,123],"_links":{"self":[{"href":"https:\/\/leonardof.med.br\/wp-json\/wp\/v2\/posts\/2871"}],"collection":[{"href":"https:\/\/leonardof.med.br\/wp-json\/wp\/v2\/posts"}],"about":[{"href":"https:\/\/leonardof.med.br\/wp-json\/wp\/v2\/types\/post"}],"author":[{"embeddable":true,"href":"https:\/\/leonardof.med.br\/wp-json\/wp\/v2\/users\/2"}],"replies":[{"embeddable":true,"href":"https:\/\/leonardof.med.br\/wp-json\/wp\/v2\/comments?post=2871"}],"version-history":[{"count":15,"href":"https:\/\/leonardof.med.br\/wp-json\/wp\/v2\/posts\/2871\/revisions"}],"predecessor-version":[{"id":2887,"href":"https:\/\/leonardof.med.br\/wp-json\/wp\/v2\/posts\/2871\/revisions\/2887"}],"wp:attachment":[{"href":"https:\/\/leonardof.med.br\/wp-json\/wp\/v2\/media?parent=2871"}],"wp:term":[{"taxonomy":"category","embeddable":true,"href":"https:\/\/leonardof.med.br\/wp-json\/wp\/v2\/categories?post=2871"},{"taxonomy":"post_tag","embeddable":true,"href":"https:\/\/leonardof.med.br\/wp-json\/wp\/v2\/tags?post=2871"}],"curies":[{"name":"wp","href":"https:\/\/api.w.org\/{rel}","templated":true}]}}