Espírito Santo proíbe saleiro na mesa de bares e restaurantes

Nesta semana começa a valer a Lei Estadual nº 10.369, de 22 de maio de 2015, que proíbe bares, restaurantes e similares de expor saleiros e sachês de sal sobre suas mesas e balcões. Algumas pessoas estão revoltadas com a Lei, e falam em despropósito, paternalismo e até ditadura. Eu mesmo fui surpreendido, e só fiquei sabendo da Lei um mês depois dela ter sido publicada. Mesmo assim, não tenho uma visão tão negativa sobre ela.

Faço minhas as palavras do filósofo Hélio Schwartsman, que um ano e meio atrás discutia uma situação semelhante em sua coluna na Folha de São Paulo:

A discussão é análoga à da obrigatoriedade do cinto de segurança. Cabe ao Estado impedir que um cidadão faça mal a si mesmo? Meus instintos libertários dizem que não, mas meu pendor consequencialista sugere que sim. Trata-se, afinal, de interferência pequena que salva vidas.

Há um meio de conciliar essas duas intuições, recorrendo ao “paternalismo libertário” proposto por Richard Thaler e Cass Sunstein. A ideia aqui é reconhecer que seres humanos frequentemente fazem escolhas erradas e, através de desenhos institucionais, tentar empurrá-los para as certas, mas sem autoritarismo.

Com o perdão pelo excesso de aspas, cito agora o parágrafo único do artigo primeiro da famigerada Lei:

Os estabelecimentos referidos no caput deste artigo poderão disponibilizar recipientes ou sachês contendo o cloreto de sódio (sal de cozinha) para o consumo, apenas quando solicitado pelo cliente.

Ao contrário do Código de Trânsito, que obriga motoristas e passageiros a usar cinto de segurança, essa nova Lei não proíbe nem as pessoas de acrescentar sal à sua comida, nem os bares e restaurantes de fornecer o sal. Tudo o que a Lei faz é criar um empecilho, de forma que a pessoa pense duas vezes antes de colocar mais sal em sua refeição.

Aliás, governo federal já vem reduzindo nosso consumo de sal, sem que a gente perceba. Graças a um acordo com o Ministério da Saúde e a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), a indústria alimentícia vem reduzindo a quantidade de sal em seus alimentos, ano após ano. Eu já escrevi sobre como a pessoa pode reduzir o seu próprio consumo de sal sem sofrimento, mas vamos combinar: é muito mais fácil mudar um comportamento quando a gente não precisa nem tomar a iniciativa.

De certa forma, a Lei que proíbe o saleiro sobre a mesa pode ser ainda mais importante do que esse acordo federal. Um motivo é que o acordo só atinge os alimentos industrializados, que não são nossa principal fonte de sal. Outro motivo, sobre o qual escreverei em breve, é que estudos científicos recentes sugerem ser uma má ideia reduzir o consumo de sal de quem já estiver na média.

Na prática, os restaurantes do Espírito Santo parecem ter recebido muito bem a Lei. Semanas antes da Lei entrar em vigor, os restaurantes que frequento já não tinham saleiro sobre suas mesas. Uma vez, vi um cliente pedir um sachê de sal, e ser atendido prontamente, sem qualquer constrangimento.

Certamente isso não me parece o fim do mundo.

Atualização: em 25 de maio de 2017, o Tribunal de Justiça do Espírito Santo decidiu que a lei é inconstitucional.

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