Durante muitos anos, os profissionais de saúde incentivaram as mulheres a fazer o auto-exame das mamas regularmente, como uma forma de detectar o câncer de mama no início e assim facilitar seu tratamento. De fato, os primeiros estudos científicos foram bastante promissores. As mulheres que praticavam ao auto-exame da mama apresentavam um risco 40% de ter câncer avançado no momento do diagnóstico, e um risco 36% menor de morrer por câncer de mama. Depois disso foram realizados estudos mais aprofundados (e caros), que chegaram a conclusões bem diferentes.
Em 2003 o British Journal of Cancer publicou um artigo de meta-análise, que interpretou em conjunto todos os estudos relevantes realizados em todo o mundo. Essa meta-análise mostrou que ensinar o auto-exame das mamas não diminui em nada a detecção ou a mortalidade por câncer de mama. Pior ainda, aumenta em 53% o risco da mulher ser submetida a uma biópsia desnecessária, e duplica a procura por atendimento médico especializado.
Quando um grupo de pesquisadores suspeita de que uma intervenção seja benéfica para a saúde das pessoas, os primeiros estudos têm um orçamento menor, porque ninguém vai colocar uma fortuna em uma pesquisa sem ter ideia alguma do resultado. Infelizmente, isso significa que os primeiros estudos costumam ser mais simples, e mais sujeitos a erros. No caso do auto-exame das mamas, as mulheres que os praticam são geralmente mais novas e com melhor nível socioeconômico, além de com mais frequência não terem chegado ainda à menopausa, o que significa que elas já teriam um menor risco de câncer mesmo se não realizassem o auto-exame.
Posteriormente foram realizados estudos de longo prazo; em vez de comparar mulheres sadias com mulheres recém-diagnosticadas com câncer de mama, esses estudos acompanharam mulheres sem câncer de mama, mas que podiam ou não estar realizando o auto-exame. Um desses estudos, realizado no Reino Unido e publicado em 1999, acompanhou 190 mil mulheres por 16 anos; um terço delas recebeu treinamento em auto-exame das mamas, e o resto, não. Outros estudos, realizados na China e na Rússia, foram ainda mais cuidadosos, porque as mulheres foram sorteadas entre o grupo com auto-exame e o grupo sem auto-exame. O primeiro acompanhou 265 mil mulheres durante 10 anos, e o outro acompanhou 120 mil mulheres ao longo de 16 anos. Todos os três foram muito consistentes em mostrar que a mortalidade por câncer de mama não foi nem um pouco alterada pelo auto-exame das mamas.
Hoje em dia, com os avanços do tratamento do câncer de mama, os tumores descobertos em fases iniciais podem ser tratados cada vez de uma forma menos invasiva. Dessa forma, se por acaso o auto-exame for capaz de detectar o tumor numa fase mais inicial, isso poderá trazer algum benefício para a mulher. A meta-análise não aborda essa questão, mas fui direto aos próprios estudos, e descobri que ao menos os estudos russo e chinês se detiveram também na estágio do tumor. E ambos estudos confirmaram que as mulheres que não foram treinadas em auto-exame das mamas descobriram o câncer tão cedo quanto as que foram treinadas.
Em vez de incluir apenas mulheres altamente motivadas, disciplinadas e exímias examinadoras, os estudos de grande porte se contentaram em dividir as mulheres entre as que receberam e as que não receberam treinamento. As que receberam treinamento tinham mais habilidade e disciplina, mas obviamente nem todas eram perfeitas. Seria possível que teoricamente mulheres disciplinadas e habilidosas pudessem detectar o câncer de mama antes das outras. Teoricamente. Mas, mesmo assim, isso não isentaria a mulher de fazer mamografia.
Os primeiros estudos, mas animadores, foram feitos quando nem mesmo os países mais desenvolvidos faziam mamografia de rotina. E a mamografia, ainda que tenha lá suas controvérsias, é comprovadamente capaz de diminuir a mortalidade específica por câncer de mama. (Leia também: Mamografia aos 40 anos é controversa
, Mamografia pode ser feita a cada 2 anos
, e Quando parar de fazer mamografia
.) Até hoje nenhum estudo mostrou que o auto-exame das mamas agregue qualquer valor à mamografia de rotina. Não que a mulher esteja proibida de tocar as próprias mamas. Claro que não. E, se a mulher descobrir algum nódulo por acaso, deve consultar um médico. Mas a rotina de examinas as próprias mamas todo mês só traz consequências negativas para a mulher.
Interessante como a estatística derruba conceitos subjetivos, muitas vezes até místicos.
Mas não gostei dessas pesquisas. O objetivo principal não foi abordado, q é se o auto-exame permite detectar prematuramente um tumor.
Pelo q eu entendi, foi feito uma estatística extremamente generalizada, apenas ensinando as mulheres a fazer. Ora, se uma mulher passa pelo treinamento mas nunca faz, ela devia ficar no grupo das q naum fizeram. O objetivo devia ser o exame em si, e não apenas saber se mulheres conhecedoras do exame são beneficiadas.
Ok, foi comprovado q conhecer o exame naum ajuda em nada. Mas conhecer por conhecer, campanhas de divulgação já ensinaram pra maioria. Óbvio q se souberem e naum praticarem naum vai ajudar, naum é preciso pesquisa pra comprovar algo óbvio assim. Nas pesquisas deviam ter pedido o comprometimento delas de fazerem o exame mensalmente e excluir as q naum adquirissem o hábito.
Mas outro ponto interessante do texto foi apontar os problemas decorrentes: aumento de consultas e exames sobre alarmes falsos. Isso derruba mais uma vez as bobagens dias pelos místicos defensores de charlatões: vemos aí médicos criticando medidas q aumentam seus lucros. E olha q é lucro direto, aumento efetivo de pacientes procurando por consultas, naum tem nada de meios mirabolantes com propinas secretas de laboratórios pagando médicos pra receitarem remédio a pessoas sadias.
Hikari, o propósito da detecção precoce é que isso faça a diferença no tratamento, aumentando as chances de cura ou diminuindo a agressividade do tratamento. Em todas as pesquisas com auto-exame das mamas, não foi constatada nenhuma diferença no tamanho ou estágio do tumor.
Concordo com a pertinência de seu questionamento com relação entre a diferença entre ensinar a fazer e efetivamente fazer. Uma pesquisa sobre intervenções clínicas pode adotar qualquer uma das abordagens, com diferentes vantagens e desvantagens. A abordagem adotada pelas pesquisas é mais importante para os profissionais de saúde, pois mostra que orientar as pacientes a fazer o auto-exame não ajuda em nada.
O auto-exame fará com que a paciente fique informada sobre qualquer mudança que a conteça em sua mama, pois com a prática do auto-exame correto ela irá conhecer melhor sua mama, isso não significa que o auto exame evitará o câncer, pois nenhuma mulher está livre do risco, porem tão logo seja encontrado um nódulo em fase inicial, melhor será o prognóstico e com certeza evitará uma mutilação severa que tanto abate as mulheres que foram submetidas a isso
Karlenes, você conhece algum estudo clínico mostrando isso? Nos estudos que encontrei, os tumores foram encontrados no mesmo estágio e tamanho, independentemente das mulheres realizarem o auto-exame ou não.