Arquivo da tag: exame

A visão de um médico de família sobre o rastreamento do câncer de próstata

No mês de outubro, o Instituto Lado a Lado Juntos pela Vida e a Sociedade Brasileira de Urologia realizam uma campanha (Novembro Azul) para estimular os homens a fazer exames de rastreamento do câncer de próstata, Ao contrário do que muita gente acredita, essa não é uma campanha do Ministério da Saúde. Na verdade, Ministério da Saúde e Instituto Nacional do Câncer (INCA) não recomendam o rastreamento do câncer de próstata, por considerarem que os malefícios superem os benefícios.

Neste ano a imprensa percebeu que não existe um consenso em torno do assunto, e o debate ganhou destaque nacional através de veículos como a Folha de São Paulo e o Jornal Nacional. Como as evidências científicas atuais são basicamente as mesmas de quando discuti o rastreamento do câncer de próstata em 2010, prefiro trazer hoje outra abordagem: explicar como médicos de família e urologistas podem ter pontos de vista tão diferentes sobre a questão.

Continue lendo

Por que os aparelhos de pressão digitais não são confiáveis?

Recentemente um leitor me perguntou o seguinte:

Prezado Dr. Leonardo gostaria de saber porque os profissionais da área de saúde sempre afirmam que os aparelhos digitais não são confiáveis para medições. Será por falta de informações ou algo direcionando procedimentos.
Observei que inclusive a SBC indica alguns fabricantes e modelos, bem como o INMETRO, onde existem testes e aferição, com respectivos selos. Existem os digitais que medem no braço e os de pulso tb, qual seria o mais indicado, caso sejam confiáveis a seu parecer. A nível de precisão qual o mais correto analógico, digital ou ambos. Desde já meus agradecimentos por todo esclarecimento profissional e poder tb repassar estas mesmas informações a todos a minha volta é profissionais da área da saúde.

Continue lendo

Ultrassom prejudica o cérebro do bebê?

O sempre antenado médico de família e comunidade Ronaldo Zonta chamou a atenção para uma coluna da Folha de São Paulo onde a neurocientista Suzana Herculano-Houzel alerta para um risco do ultrassom realizado durante a gravidez:

[…] Pasko Rakic, um dos maiores especialistas mundiais no desenvolvimento do sistema nervoso, […] descobriu que, aplicada a camundongas gestantes em condições comparáveis às dos exames feitos com mulheres grávidas, a ultrassonografia tem o potencial de perturbar a migração dos neurônios que formarão o cérebro dos filhotes. Quanto maior o tempo de exposição, maior a porcentagem de neurônios que se perdem ao longo do trajeto de migração do local onde eles nascem até seu destino no córtex cerebral. A porcentagem sobe de 5% nos animais controle para 19% em animais expostos ao ultrassom por sete horas, o maior tempo testado no estudo. […]

Continue lendo

Quando fazer atividade física sem passar pelo médico

Nesta sexta-feira estarei em Colatina para a 6ª Jornada Capixaba de Medicina de Família e comunidade. Como nas edições anteriores, ela será realizada dentro do Congresso Médico Estadual da AMES. Desta vez, apresentarei uma palestra sobre a utilização do eletrocardiograma na atenção primária à saúde. Basicamente, vou explicar quando vale a pena pedir esse exame, e quando é que um resultado normal realmente pode deixar a gente tranquilo.

Secretaria de Saúde inaugura mais uma Academia da CidadeAproveito para divulgar aos leitores do Doutor Leonardo um critério para a pessoa saber se precisa ou não passar por avaliação médica antes de começar a praticar exercícios físicos.

Continue lendo

O exame pode não ter salvado a sua vida

O câncer ainda é uma doença que inspira terror. Algumas pessoas simplesmente se recusam a falar seu nome, preferindo dizer “aquela doença”. Quando a gente fala em câncer, o que vem à mente é uma pessoa saudável que começou a sentir algo e, depois de uma avaliação médica, descobriu que terá poucos e dolorosos meses de vida pela frente. Por isso, quando uma pessoa descobre um câncer num exame de rotina, é compreensível que ela acredite que o exame tenha salvo sua vida.

Acontece que muitos tipos de câncer simplesmente não são tão letais assim. Se a pessoa com câncer não fizer o exame, corre um risco razoável de morrer — por outra causa — sem saber que tinha a doença. E, se o câncer for pouco agressivo, fazer o diagnóstico com anos de antecedência pode fazer pouca diferença nas chances de cura. (Repare que estou falando em anos, e não em estágio clínico.) Além disso, alguns exames são capazes de dizer qual é o grau de agressividade do câncer, mas nunca é possível ter certeza se o tumor vai ou não matar a pessoa.

Mama sendo comprimida para obter imagem mamográfica ótima.

No caso do câncer de mama, um estudo recém-aceito pela revista Annals of Internal Medicine calculou qual é a chance, para uma mulher que descobriu o câncer de mama num exame de rotina, de que a mamografia tenha realmente salvado a sua vida.

Continue lendo

Dicas de leitura: exame de colesterol, licença para comer ovo

O blog Medicina de Família publicou recentemente dois artigos que certamente interessarão a boa parte dos leitores do Doutor Leonardo:

  • Omelete sem culpa — Um estudo com dados do terceiro National Health and Nutrition Examination Survey não encontrou relação entre o consumo de ovos e o risco de morte por doença isquêmica do miocárdio (infarto e seus amigos) ou doença isquêmica cerebral (AVC).
  • Dosagem seriada de colesterol: há indicação? — Esse artigo fui eu quem escreveu, mas pedi a eles que publicassem porque é voltado para médicos. (Prefiro publicar aqui material que também seja interessante para as pessoas em geral.) Em resumo, dois estudos realizados em contextos diferentes mostraram que a variabilidade dia-a-dia do colesterol é tão grande que, se solicitarmos o exame em intervalos menores que 3 anos, a maior parte da variação de um exame para o outro terá sido por imprecisão, e não por mudanças verdadeiras no metabolismo do colesterol.

Overdose de diagnóstico

Ainda estou entretido com o capítulo de livro, e minha dissertação de mestrado ainda não está online, então trago a vocês uma outra leitura pertinente. A entrevista do médico norte-americano H. Gilbert Welch à Folha de São Paulo tem dado o que falar, ao menos entre os médicos de família e comunidade. É que ele expôs, num dos principais veículos de comunicação de massa do país, que o famoso check-up também pode fazer mal à saúde:

Continue lendo

Auto-exame das mamas faz mal à saúde

Durante muitos anos, os profissionais de saúde incentivaram as mulheres a fazer o auto-exame das mamas regularmente, como uma forma de detectar o câncer de mama no início e assim facilitar seu tratamento. De fato, os primeiros estudos científicos foram bastante promissores. As mulheres que praticavam ao auto-exame da mama apresentavam um risco 40% de ter câncer avançado no momento do diagnóstico, e um risco 36% menor de morrer por câncer de mama. Depois disso foram realizados estudos mais aprofundados (e caros), que chegaram a conclusões bem diferentes.

É mostrada uma mulher negra adulta nua da cintura para cima, realizando o auto-exame das mamas. Seu braço esquerdo está elevado e ela está examinando sua mama esquerda com a mão direita.

Em 2003 o British Journal of Cancer publicou um artigo de meta-análise, que interpretou em conjunto todos os estudos relevantes realizados em todo o mundo. Essa meta-análise mostrou que ensinar o auto-exame das mamas não diminui em nada a detecção ou a mortalidade por câncer de mama. Pior ainda, aumenta em 53% o risco da mulher ser submetida a uma biópsia desnecessária, e duplica a procura por atendimento médico especializado.

Continue lendo

Quando parar de fazer mamografia

Chega uma época na vida da pessoa em que os exames de rotina precisam ser repensados. Assim como muitos idosos não vêm benefício em adotar um estilo de vida mais saudável (por exemplo comendo mais salada), a rotina de mamografia precisa ser rediscutida com a pessoa quando ela atinge os 70 anos de idade.

O documento da Femama que citei há duas semanas não aborda a questão de quando (ou se) parar de fazer mamografia a partir de alguma idade; e o Inca não faz recomendações para as mulheres com 70 anos ou mais de idade.

Não existem dúvidas de que a mamografia continua sendo efetiva na detecção precoce do câncer de mama depois dos 70 anos. Na verdade, quando mais idosa a mulher, melhor a mamografia, pois fica mais fácil identificar calcificações anormais e pequenos nódulos. O problema é que, depois de uma certa idade, aumenta muito a chance do exame detectar um câncer que não traria qualquer consequência para a mulher.

Continue lendo

Mamografia pode ser feita a cada 2 anos

No artigo em que discuti os prós e os contras da mamografia a partir dos 40 anos de idade, falei o tempo todo em mamografia anual. De fato, tudo indica que nessa faixa etária a mamografia anual seja melhor que a bianual. Mas, no que diz respeito às mulheres com 50 anos de idade ou mais, a frequência ideal é alvo de uma nova discussão. O Inca recomenda mamografia a cada 2 anos, enquanto a Femama divulga que toda mulher deve fazer o exame anualmente.

Um estudo (em inglês) encomendado pela Força-Tarefa de Serviços Preventivos dos Estados Unidos reuniu uma série de pesquisas feitas até hoje, e chegou à conclusão de que fazer mamografia de 2 em 2 anos traz entre 67% e 99% do benefício de se fazer todo ano. Os riscos da mamografia, por outro lado, são proporcionais ao número de exames realizados, e não são nada desprezíveis.

Continue lendo