De acordo com a Organização Mundial da Saúde, a obesidade é um dos fatores de risco modificáveis mais prejudiciais à saúde. O problema é que, na prática, poucas pessoas conseguem emagrecer e manter essa perda de peso a longo prazo. Dessa forma, faz sentido prestarmos atenção em abordagens alternativas como a Health at Every Size (HAES; em português: Saúde em Qualquer Tamanho), que faz uma opção explícita por promover um estilo de vida saudável sem emagrecimento.
O diferencial da HAES está nas seguintes propostas:
- Aceitação do corpo — As pessoas são encorajadas a aceitar seus corpos como são, em vez de perseguirem um corpo mais magro.
- Suporte à alimentação intuitiva — As pessoas são encorajadas a observar a relação entre o que comem e como elas se sentem a curto e médio prazo, e usar esse conhecimento para determinar o que vão comer, em vez se seguir regras “externas”.
- Suporte à incorporação ativa — As pessoas são estimuladas a incorporar a atividade física ao seu dia-a-dia, tendo em vista o auto-cuidado e o bem-estar, em vez de desenvolver programas estruturados de exercícios físicos.
De acordo com os adeptos da HAES, a obesidade não causa adoecimento ou mortalidade, a não ser em casos extremos. Desconfio que essa ruptura com o consenso científico atual agradará muito às pessoas que desconfiam das instituições de uma forma geral, bem como às pessoas que estão cansadas de fazer dieta. Por isso mesmo, resolvi resumir os principais estudos que se propuseram a verificar a eficácia e a efetividade da abordagem HAES.
Os estudos foram realizados respectivamente no Reino Unido, nos Estados Unidos da América, e no Canadá. As pessoas que participaram do estudo eram mulheres obesas ou com sobrepeso (definidos pelo IMC), com idade entre 30 e 45 anos em um estudo, e na meia-idade e/ou na perimenopausa nos outros dois. Um dos estudos só incluiu mulheres que tentavam dieta havia muito tempo, e outro só incluiu mulheres excessivamente preocupadas com seu peso. Os programas de intervenção duravam 4 ou 6 meses, com um acompanhamento de 6 a 12 meses após o fim da intervenção.
Confira as conclusões:
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Ambos programas de terapia cognitivo-comportamental [com e sem foco no emagrecimento] foram bem-sucedidos em induzir perdas de peso modestas, assim como em melhorar o bem-estar, reduzir o sofrimento, aumentar a atividade e a aptidão físicas, melhorar a qualidade da alimentação, e reduzir os fatores de risco cardiovasculares. Essas melhorias foram mantidas e/ou continuadas até o acompanhamento de 1 ano. Esses resultados sugerem que o tratamento baseado no novo paradigma de controle de peso, que enfatiza mudança de estilo de vida sustentada sem ênfase na dieta, pode produzir benefícios modestos para a saúde e o bem-estar. (Rapoport, Clark & Wardle, 2000)
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Ao longo de um período de 1 ano, uma abordagem de dieta resulta em perda de peso para quem completa a intervenção, ao contrário da abordagem de não-dieta. No entanto, uma abordagem de não-dieta pode produzir melhorias similares em aptidão metabólica, psicologia e comportamento alimentar, ao mesmo tempo em que efetivamente minimiza a desistência comum aos programas de dieta. (Bacon e colaboradores, 2002)
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Esses resultados sugerem que, quando comparados a um grupo de controle [sem intervenção alguma], uma abordagem HAES poderia ter efeitos benéficos a longo prazo no comportamento alimentar com relação a desinibição e fome. Além disso, nosso estudo não mostrou um diferencial nos efeitos da abordagem HAES quando comparada a uma intervenção restrita ao suporte social. (Provencher e colaboradores, 2009)
Resumindo, a fundamentação teórica da HAES rompe com o consenso científico atual, mas os resultados da abordagem não são muito diferentes, nem para melhor, nem para pior. Seria muito interessante avaliar a abordagem em populações mais variadas, bem como por pesquisadores com convicções mais variadas.
Health at Every Size é o nome do livro em que a nutricionista Linda Bacon defende sua proposta para o público geral, mas esse livro ainda não chegou ao Brasil. Para os profissionais de saúde com nível superior, posso sugerir a leitura de um artigo em que Bacon & Aphranor (2011) apresentam uma revisão abrangente da literatura científica que dá suporte à teoria. (Nenhuma evidência contraditória é apresentada ou admitida pelas autoras.)